Guerra do tráfico transforma trecho de avenida Bonocô em zona de alto risco
Moradores de
Cosme de Farias e Brotas estão sob ameaça. Morte do traficante Titanic
gera boatos, onda de medo e fecha escolas e comércio na região
A rivalidade entre dois grupos separada por
aproximadamente 500 metros de asfalto. O trecho entre duas passarelas da
Avenida Bonocô, que liga a BR-324 ao Comércio e por isso é uma das mais
movimentadas de Salvador, é considerado atualmente por comerciantes e
moradores como a Faixa de Gaza da região de Brotas. O trecho após a
Sanave até as imediações da Le Biscuit, é conhecido pelos intensos
confrontos entre traficantes de Campinas de Brotas e Cosme de Farias,
cada um de um lado da avenida.
Segundo a polícia, esses crimes estão relacionados à
guerra entre duas facções. De um lado da via, em Campinas de Brotas,
estão dois grupos ligados ao traficante Perna, Genilson Lima da Silva,
custodiado em penitenciária federal. Nas localidades de Torre e Brongo,
em Campinas de Brotas, são comandadas por Alex e pela dupla Robson e
Del, respectivamente.
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As
duas se uniram há aproximadamente seis meses para tentar tomar as bocas
de fumo do traficante Olho de Gato, da Baixa do Tubo, localidade de
Cosme de Farias. Olho de Gato, que faz parte da facção Comando da Paz,
cumpre pena no Complexo Penitenciário da Mata Escura e tinha como braço
direito Tiago Guimarães Pinto, o Titanic, morto junto com o irmão Jacson
Guimarães e o comparsa Diogo dos Santos, durante uma operação da
polícia em Camaçari, na quinta-feira.
Ontem, alguns comerciantes e moradores de Cosme de
Farias receberam um comunicado de “toque de recolher” via WhatsApp
(aplicativo de celular) de supostos traficantes que atuam na região. A
ação dos bandidos seria uma forma de represália pelas mortes de Titanic.
Medo
Morador há mais de 20 anos da Baixa do Tudo, em Cosme de Farias, Seu Binha, 55 anos, tinha os passos largos na manhã de ontem. Questionado pela equipe do CORREIO sobre o porquê de tanta pressa, ele parou, respirou fundo, olhou para o lado e para o outro, provavelmente para saber se era observado, e desabafou: “Estou com muito medo. Essa guerra parece não ter fim”, disse.
Morador há mais de 20 anos da Baixa do Tudo, em Cosme de Farias, Seu Binha, 55 anos, tinha os passos largos na manhã de ontem. Questionado pela equipe do CORREIO sobre o porquê de tanta pressa, ele parou, respirou fundo, olhou para o lado e para o outro, provavelmente para saber se era observado, e desabafou: “Estou com muito medo. Essa guerra parece não ter fim”, disse.
Ele até hoje sente a dor dos conflitos. “Meu
sobrinho está até agora internado no HGE depois de ter sido baleado
quando voltava do trabalho. Era por volta das 14h, quando ele ficou no
meio de um confronto na passarela do Bonocô em frente à Insinuante”,
contou. O fato aconteceu em dezembro.
Um rapaz identificado como Vanderson disse que há um
ano se mudou da Baixa do Tubo por conta da violência. “São meninos
entre 14 e 17 anos, que formam grupos de oito, dez, até 12 homens
armados que costumam atacar o outro lado. Os confrontos são sempre nas
passarelas”, contou o rapaz, que ontem foi na casa de parentes.
O funcionário de uma loja de tintas disse que os
confrontos não têm horário para acontecer. “Meio-dia, 14h, 18h, 21h, não
tem tempo ruim para eles. Não temem a polícia”, contou. Segundo ele, os
grupos passam o dia inteiro um procurando pelo outro. “Meninos de 12,
13 anos atuam como olheiros. Observam a chegada dos rivais e acionam os
maiores, que saem dos becos com fuzis, minimetralhadoras, pistolas ponto
40 e abrem fogo. Não querem saber”, relatou.
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Polícia circula pela Baixa do Tubo em tarde tensa por ameaças
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“Quem
mora na Baixa do Tubo não vem aqui, no Brongo. E quem mora aqui não
pode ir lá. A desobediência é a morte”, avisou o dono de um bar situado
atrás da Le Biscuit. “Tenho parentes que moram na Baixa, que tinham
antes como opção subir por aqui para chegar mais rápido no Brotas
Center, onde trabalham. Agora, eles sobem pelo final de linha de Brotas e
seguem andando até lá”, contou.
A dona de um salão de beleza disse que tem dias que
as duas passarelas - após a Sanave até as imediações da Le Biscuit – são
ocupadas pelos bandidos. “Ficam um de um lado esperando o outro cruzar.
As pessoas com medo não passam. Quando a polícia chega, todos já
dispersaram”. Ela relatou ainda que assaltos são constantes. “Um grupo
sempre tenta roubar na área do outro e é mais um motivo para eles se
digladiarem”, complementou.
Mortes
Segundo dados da Secretaria da Segurança Pública (SSP), só este ano cinco pessoas já foram mortas e outras quatro baleadas em Cosme de Farias. Logo no primeiro dia do ano, um homem morreu após um assalto em uma das passarelas da Bonocô.
Segundo dados da Secretaria da Segurança Pública (SSP), só este ano cinco pessoas já foram mortas e outras quatro baleadas em Cosme de Farias. Logo no primeiro dia do ano, um homem morreu após um assalto em uma das passarelas da Bonocô.
A polícia ainda informou que três suspeitos
abordaram o homem na passarela para roubar os pertences e em seguida
dispararam contra ele. No dia 13 de janeiro, a líder comunitária
Cleonice Cardoso dos Santos foi baleada em várias partes do corpo dentro
de casa, na rua Pedro Gordilho, na Baixa do Tubo. Segundo a polícia,
ela foi morta por integrantes do grupo de Titanic.
Cleonice, que foi candidata a vereadora, teria sido
morta por denunciar o tráfico da região. No dia 1º de fevereiro, um
rapaz que saiu de um bar em Cosme de Farias foi baleado no tórax. No dia
5, um adolescente de 15 anos e Virgílio Santos Brito, 22, foram
baleados na avenida, após assaltarem um mercadinho. Um homem que
presenciou a ação atirou e matou Vinicius e feriu o adolescente.
Polícia inibe manifestação na Bonocô
Por conta da ameaça de uma manifestação na Avenida Bonocô, ontem, policiais militares reforçaram o policiamento em toda a via. De acordo com a Transalvador, o protesto pediria segurança, depois da morte do traficante Titanic. O ato estava previsto para começar às 9h, mas a presença da polícia inibiu os manifestantes e o protesto não aconteceu.
Por conta da ameaça de uma manifestação na Avenida Bonocô, ontem, policiais militares reforçaram o policiamento em toda a via. De acordo com a Transalvador, o protesto pediria segurança, depois da morte do traficante Titanic. O ato estava previsto para começar às 9h, mas a presença da polícia inibiu os manifestantes e o protesto não aconteceu.
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Polícia reforça segurança sob o viaduto do metrô na Bonocô. Morte do traficante Titanic gera boatos com ameaças de bandidos
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Boato de toque de recolher deixa população acuada; escolas fecham
No dia seguinte à Operação Destroyer, deflagrada na quinta-feira pela polícia, o clima ainda era de temor em Cosme de Farias. Desde a noite de quinta, mensagens que aconselhavam moradores dos bairros de Brotas e Cosme de Farias a não sair de casa foram espalhadas pelas redes sociais.
No dia seguinte à Operação Destroyer, deflagrada na quinta-feira pela polícia, o clima ainda era de temor em Cosme de Farias. Desde a noite de quinta, mensagens que aconselhavam moradores dos bairros de Brotas e Cosme de Farias a não sair de casa foram espalhadas pelas redes sociais.
“O pessoal estava compartilhando essa mensagem e
muita gente ficou com medo. Ontem (anteontem), as ruas já estavam vazias
quando deu 20h. Eu mesmo saí do trabalho mais cedo, para não chegar
depois do anoitecer”, contou um morador de Cosme de Farias, que não quis
se identificar. Com medo, pais de alunos das nove escolas municipais do
bairro não enviaram seus filhos para as aulas.
Segundo a assessoria da Secretaria Municipal de
Educação (Smed), cinco escolas que ficam próximas do local onde ocorreu a
ação dos policiais não tiveram aula, porque os alunos não compareceram.
Uma das instituições que ficaram fechadas foi a Escola Municipal Olga
Figueiredo de Azevedo, que atende a 889 alunos da região.
Nas outras quatro instituições, houve aula pela
manhã. A Smed, cuja sede fica no Engenho Velho de Brotas, também liberou
parte de seus funcionários mais cedo, ontem. Segundo a assessoria do
órgão, apesar de o expediente terminar às 17h, servidores que moram
próximo foram dispensados, porque estavam com medo dos rumores
espalhados pelas redes sociais.
No entanto, segundo o delegado Daniel Menezes, da
Delegacia de Homicídios Múltiplos, o toque de recolher não passou de um
boato. “Não aconteceu nada hoje (ontem). Estive lá hoje de manhã e o
pessoal disse que a paz voltou a reinar”.
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Portão da Escola Municipal Olga Figueiredo amanhece com pichação do Comando da Paz.
Instituição não abriu |
Já o major Saulo Roberto, comandante da Rondesp
(Atlântico), não descarta que as mensagens sejam repassadas por pessoas
ligadas ao traficante Tiago Titanic, morto na quinta-feira. “As pessoas
viviam acuadas. Quando surge qualquer informação, eles ficam com medo.
Mas a gente não vai permitir que isso retorne”, garantiu.
PM reforça policiamento após operação que matou líder da área
Para acalmar a população, a Polícia Militar intensificou o policiamento na região de Cosme de Farias, desde a operação da quinta-feira. Segundo o major Fernando Leite, comandante da 58ª Companhia de Polícia Militar (Cosme de Farias), só na Baixa do Tubo dez viaturas da PM fazem rondas. Cada viatura conta com três policiais.
Para acalmar a população, a Polícia Militar intensificou o policiamento na região de Cosme de Farias, desde a operação da quinta-feira. Segundo o major Fernando Leite, comandante da 58ª Companhia de Polícia Militar (Cosme de Farias), só na Baixa do Tubo dez viaturas da PM fazem rondas. Cada viatura conta com três policiais.
Já na Avenida Bonocô, cinco policiais se dividem em
três motos do Grupo de Ações Rápidas e Repressivas do Águia (Garra).
“Vamos manter esse esquema até a região ficar mais tranquila, com o fim
das mensagens (de toque de recolher)”, afirmou. Ainda ontem, outro
traficante da quadrilha de Tiago Titanic foi preso, de acordo com o
major Saulo Roberto, comandante da Rondesp (Atlântico).
O suspeito, identificado apenas como Gão, foi
encontrado por policiais da Operação Apolo, que continuam fazendo o
policiamento na área de Cosme de Farias. “Ele estava escondido em uma
das ruas do Alto do Cruzeiro”, disse o major, referindo-se à localidade
que fica dentro do bairro.
Ainda segundo Roberto, Gão é apontado como um dos
suspeitos de ter participado do crime que resultou na morte do bebê
Cauã Néri Cruz, de 1 ano e 10 meses. A criança estava com a mãe, Camila
Arruda, 18, e o namorado dela, Leandro Alves Pereira, 28, quando quatro
homens invadiram o imóvel e dispararam tiros contra a família.
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